EXPERIENCIA BLOG: 9ºJANTAR DE 75


segunda-feira, abril 17, 2006

9ºJANTAR DE 75

Nenhuma geração representa tão bem a década de 70 como a geração de 75. Constituída por cada um de nós aqui nesta sala, por outros igualmente fantásticos que não puderam estar presentes, e que todos os dias se esforçam por inovar, progredir, educar e viver.

Por termos nascido mesmo no meio desta década podemos orgulhosamente pensar que somos aqueles que verdadeiramente a caracterizam. Se há aqueles que se intitulam como pertencentes à geração do ano da revolução, nós somos os que verdadeiramente nasceram em liberdade.

A nossa existência foi o primeiro grito de liberdade desses então jovens, os nossos pais, que cresceram e se tornaram adultos torneando as dificuldades criadas por um país até à data oprimido e amordaçado a ideais que felizmente não perduram, e que hoje apenas são marcos da nossa história. Fomos concebidos por esses jovens então livres, e tornámo-nos no expoente máximo desse seu sonho de liberdade.

Nascemos então nesse ano de 1975…
Mas o que será que nos torna tão especiais?

Éramos crianças que andávamos de carro, aqueles que tinham sorte de o ter, não tínhamos cadeirinhas, não tínhamos cintos de segurança, não tínhamos travões ABS, e airbags era palavra sem significado.
Andar na parte de trás de uma carrinha de caixa aberta era para nós sempre um passeio especial que ainda hoje recordamos com nostalgia. Andávamos em motorizadas sem capacete, pequenitos, sentados em cima de um depósito de gasolina, fascinados pela emoção.

Andámos em bicicletas, e nunca ninguém nos disse que deveríamos usar um capacete… gastámos horas e horas a construir os nossos carros de madeira, e lançávamo-nos em corridas desenfreadas em estradas inclinadíssimas e sem alcatrão… e tudo isto sem travões.

Tínhamos escola de manhã, chegávamos a casa para almoçar, e voltámos para a escola. Quando saíamos a nossa única preocupação era a de chegar a casa antes do anoitecer.

Pegávamos na nossa bicicleta, íamos a casa de um amigo, entrávamos sem bater à porta, e saíamos para brincar. Vivíamos neste mundo ainda não global, não tínhamos medos, e as regras eram definidas por nós.

Inventávamos jogos com pedras, paus, feijões, cartas, fazíamos bolos de lama, brincávamos com pequenos monstros, besouros, lesmas, minhocas e pirilampos, mesmo que os nossos pais nos proibissem de o fazer…

Não existiam Playstations, Segas, Nintendos, não tínhamos TV cabo, não tínhamos computador, e mais incrível ainda…não tínhamos telemóvel, por isso ninguém nos poderia localizar…

Tínhamos televisões a preto e branco, com dois canais, que pagavam taxa, e aprendemos com ela alguns dos grandes valores que ainda hoje carregamos, e que fazem de nós as mulheres e os homens bestiais que somos.

Tínhamos os nossos heróis, e no fundo ambicionávamos ser como eles.
Quem não se lembra com saudade desse rapaz descalço de nome Tom Sawyer, esse menino que trepava árvores, corria e brincava livremente, ia para a escola, e que no fundo carregava a inocência e ingenuidade que também nós carregávamos.

As nossas vidas eram preenchidas pelas aventuras destes heróis, que para nós tinham estatuto sagrado e indestrutível.

Vibrávamos com o Dartacão, esse herói canídeo, que andava apaixonado por uma cadela caniche, uma espécie de amor proibido, sempre apoiado pelos seus amigos e companheiros Athos, Phortos e Aramis. Nunca nos questionávamos como era possível que cães falassem, andassem a cavalo e tivessem espadas…para nós isso não era importante…

Mas se estes heróis eram mais apreciados pelos meninos, também havia aqueles que eram sagrados para meninos e meninas… a ABELHA MAIA, o sítio do picapau amarelo, conan o rapaz do futuro, os marretas, os heróis de shaolin, willy fog e tantos outros que nos apaixonaram nessa etapa da nossa vida…

Este exercício que nos propusemos fazer fez-nos recordar momentos que tanto nos influenciaram, e que hoje recordamos com saudade.

E se hoje a maior parte de nós não passa sem o café de Sábado à noite, tempos houve em que não dispensávamos um certo Verão de Sábados à tarde… quem não se lembra do Piranha e companhia do VERÃO AZUL?

E continuámos a crescer… quando as coisas não corriam bem na escola tínhamos de repetir o ano, mas não era o fim do mundo… ficávamos mais maduros… nunca precisámos de psicólogos, nunca nos levaram ao médico dizendo que éramos hiperactivos.

Jogámos à bola, ao berlinde, ao elástico, e até ao beijinho…
Tínhamos liberdade, sucesso, problemas, desilusões, mas sempre tivemos responsabilidade.

E não havia meio de pararmos de crescer… os rapazes começaram a gostar de raparigas, as raparigas dos rapazes, e provavelmente, rapazes que até gostaram de rapazes e raparigas que gostaram de raparigas, e não era por causa disso que o mundo não era perfeito.

Mais tarde apercebemo-nos que não vamos parar de crescer, e vamos deixar de ser meninos e meninas, deixámos de usar bata, íamos de camioneta para a escola, ou então íamos à boleia… e nunca nos aconteceu nada.

Precisávamos então de outros heróis, gente crescida que dominava sempre, contra tudo e todos, todos os maus da fita.

Nesta altura ainda não podíamos guiar, apesar de alguns já o fazerem, mas todos dizíamos que se tivéssemos um carro ele deveria ser igual ao do Justiceiro… Nós também queríamos um carro com luzinhas no capo, que pensava, falava, e que vinha sozinho sempre que o chamassem pelo relógio… claro que quando esse justiceiro mudou de profissão, e tornou num salva-vidas, nós deixamos de gostar dele.

Para nós, a hora sagrada do Domingo não era a da missa, mas sim ao fim da tarde, altura em que um outro herói entrava nas nossas casas e nas nossas vidas, de seu nome MACGYVER, que nos fascinou com as mais fantásticas aventuras.

A nossa vida foi-se alicerçando com o auxílio destes heróis, primeiro animados, depois de carne e osso, ouvimos músicas, vimos filmes, alguns dos quais recordamos com emoção.
Regresso ao futuro, Academia de Polícia, Indiana Jones e tantos outros que a memória já dificilmente consegue enumerar…
Se fosse por nós essas míticas sequelas ainda hoje não teriam terminado…

A memória das pessoas sustenta-se sobretudo em imagens, músicas e emoções, que hoje, dia 27 de Novembro de 2004 aqui relembramos.

Relembrar com tantos amigos estes momentos únicos e inesquecíveis das nossas vidas foi de facto emocionante.
Tenho a certeza que no próximo ano, e nos muitos que oxalá se seguirão, nos haveremos de voltar a encontrar, sempre em maior número, com outras animações, experiências e vivências, mas sempre com a mesma emoção e entusiasmo.

Obrigado a todos pela vossa presença.


Nelson Paciência, 27 de Novembro de 2004